terça-feira, maio 09, 2006

Quando se trata da mente humana, nada é Óbvio


Num modesto bairro residencial de East Buckingham, uma zona periférica de Boston banhada pelo rio Mystic, Jimmy (Sean Penn), Dave (Tim Robins) e Sean (Kevin Bacon) brincam na rua. Uma brincadeira subitamente interrompida por um homem que se faz passar por polícia e que leva Dave no seu carro.
Esse jovem, desaparecido durante quatro longos dias, foi sexualmente abusado e psicologicamente maltratado.

É este o início de “Mystic River”, um filme do septuagenário realizador e actor Clint Eastwood. Depois do excelente “Dívida de Sangue”, Eastwood regressa, desta vez apenas como realizador, (sabendo que voltou como actor/realizador neste recente Million Dollar Baby) para assinar um extraordinário filme, assumidamente herdeiro dos cânones clássicos.

Depois do quadro inicial, o argumento, baseado no romance de Dennis Lehane, recoloca a acção no presente. As feridas do passado trágico foram sendo cicatrizadas pelas águas límpidas e profundas do Rio Mystic. Ao ritmo das águas 25 anos passaram, e os três amigos, pelas vicissitudes da vida ou pela absoluta incapacidade de ultrapassarem a tragédia, há muito se separaram.
Mas quando a filha de Jimmy é assassinada em circunstâncias misteriosas, os três amigos reencontram-se. Sean, polícia de profissão, vai investigar o caso e constata que há fortes indícios de que o assassino seja Dave.

“Mystic River” é, antes de mais, um filme com uma dimensão humana imensa. Sob a capa de um policial, o filme viaja até aos mais recônditos lugares da alma humana e traz à superfície os segredos e o turbilhão de sentimentos que habitam as personagens. É, assim, um filme que lida directamente com o passado e com os reflexos que ele tem no presente e no futuro de cada personagem.
Sobretudo, põe o acento tónico naqueles acontecimentos que podem alterar radicalmente a nossa relação connosco e com os outros e que, no limite, podem transformar-nos em pessoas diferentes. A experiência traumática que Dave viveu jamais o abandonou. Pode mesmo dizer-se que o verdadeiro Dave morreu: depois das agressões que sofreu, resta apenas um ser traumatizado, incapaz de se libertar das memórias que o atemorizam e que vai apenas sobrevivendo, arrastando-se pela vida sem esperança ou conforto.
Tudo teria sido diferente se em vez de Dave tivesse entrado naquele carro outro dos seus amigos, mas o destino reservou-lhe essa experiência, impossível de esquecer ou apagar.

Este é, ainda, um filme que nos confronta directamente com a morte e com as suas implicações.
Nesse sentido, “Mystic River” é um filme sombrio, perturbante e comovente. As interpretações são deixadas para um elenco sublime: Sean Penn é assombroso na construção da ambiguidade moral da sua personagem, Kevin Bacon é seguro, contido e eficaz enquanto policial e Tim Robins, com a tarefa interpretativa mais complexa, é excelente. Este trio de protagonistas é, ainda, coadjuvado por um magnífico elenco de secundários: Laurence Fishburne, Marcia Gay Harden e Laura Linney ( que dizer mais com actores assim ).

Além da brilhante realização de Eastwood, do argumento de qualidade superior e das magníficas interpretações, “Mystic River” possui um dos finais mais atordoantes e arrebatadores dos últimos tempos. No seu todo, o filme é uma das experiências mais fortes e marcantes, contendo uma análise cortante do ser humano e uma mensagem clara: quando se trata da mente humana, nada é óbvio, mesmo que pareça. Enquanto obra cinematográfica, “Mystic River” é, sem dúvidas, um dos grandes filmes deste novo milénio! . Fica a dica....

3 comentários:

  1. Pretendo seguir a Dica ;)

    Perante 1 tão perspicaz e esclarecedor "retratamento", seria impossível agir de outra forma...

    ...portanto meu caro amigo, o meu próximo filme, será definitivamente Mystic River!!!

    Kisses*******************************************

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  2. É uma muito boa escolha, como não poderia deixar de ser do nosso caro cimento. Parabens pela tentativa de elevar os conhecimentos cinéfilos da malta turca um enorme bem haja

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  3. Grande movie por acaso! Um bocado parado, mas com um fim realmente muito bom.

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